domingo, 19 de fevereiro de 2012

A greve do carnaval*


Imagine um dia, talvez um sábado, ou mesmo uma segunda feira de carnaval. As ruas do Rio vazias. Nenhum bloco; nenhum cordão; nenhum baile; nenhum bêbado cantarolando alguma marchinha; nenhum casal brigando por ciúme; nenhum beijo despretensioso. Imaginem um carnaval que os foliões fizessem greve. Não fossem às ruas. Uma greve de carnaval. 

As ruas ficariam desertas. Mais desertas que um início de madrugada de segunda feira. Os comerciantes, estes ficariam em pânicos: os donos dos bares ficariam loucos pensando na “fortuna” por eles gasta para encher seus estoques à espera de foliões e bêbados que não mais apareceriam. A polícia - essa coitada! – perderia grande parte de sua renda extra de extorsão dos foliões exagerados – presas fáceis desse tipo de investimento. Mas o que causaria isso? O que causaria uma greve de carnaval, unindo o folião, o bêbado, os comerciantes ambulantes, os diretores de blocos, os compositores de marchinhas, os sambistas com seus violões e pandeiros?
Esse quadro me foi desenhado por um sujeito que se dizia viajante do tempo, vindo de 2014, ano em que tal fato ocorrera. Eu o encontrara numa rua próxima à Praça XV andando perdido em meio aos blocos com suas camisas cheias de patrocínio e com suas letras que não diziam muito mais do que um montante de vogais.
Ao ser perguntado sobre tal fato, ele responderia direto, com uma certeza nítida: — A velha e conhecida de todos nós, a ganância, a ânsia enlouquecida por lucro, a mercantilização das relações humanas e seus derivados.

O carnaval havia se voltado para o turismo, para os de fora. Tudo invertido na cidade, preparada para servir de vitrine para os gringos. 

Nada contra. Mas se eles são turistas, que aprendam a conviver com as coisas como estão, e não as modifiquem para melhor atender seus desejos de “caricatura de povo”, de "carnaval", de "mulatas", de "malandro sambista". E a Ordem, essa velha inimiga do povo – essa amante de mentes pequenas e positivistas, que tem medo do povo – impediu a brincadeira de ocorrer fora de seus padrões de “choques", intimidando o povo, acabando com os coretos e com a espontaneidade da brincadeira. Favorece – isso sim! – os donos de comércio e bares, que se fecharam nos seus salões com ar condicionado e com suas músicas ao vivo, com seus preços exagerados que afastam o folião autêntico, o brincalhão, o fanfarrão, o bêbado. Tudo fica perfeito para a “playboyzada” curtir com os cartões de créditos patrocinados pelos pais, os mesmos pais que assumiram a organização da festa, a nossa burra elite. 

Foi assim, diante desse quadro que se organizou – ou melhor, que se desorganizou - a greve de sábado foi passando pelo domingo (recorde de presença das missas), pela segunda e, quase terminando na terça feira, foi entrando pela quarta. Logo quando todos achavam que a festa tinha ido para o buraco, quando todos consideravam o fim do carnaval carioca; a morte, tão decretada, do samba... Estourou a festa do povo! 

Num passe de mágica, as ruas foram tomadas não para buscar os bares com seus donos falidos, mas para fazer a brincadeira de rua. Desfilar pela Avenida Rio Branco, pela Presidente Vargas, correndo, brincando, com bate-bola, mascarados, foliões, sambistas, diretores de blocos e claro, nosso amigo de sempre, o bêbado, com seu vasto repertório de sátiras, de marchinhas antigas e filosofias de botequim. 

Foi o ano em que nenhum dinheiro caiu nos cofres da elite. Foi o ano do choque da desordem urbana, pois afinal quem quer manter essa ordem aí? Eu não... 

Assim, meu amigo viajante do tempo entrou numa viela, dessas que tem um monte na cidade, e sumiu gritando: — Viva o povo trabalhador, brincalhão, alegre, folião e claro, combatente, valente e brigão, como deve mesmo ser.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

A privataria é tucana?

Para um governo como o de Dilma Rousseff, que se elegeu com a promessa de barrar uma nova onda de privatarias da dupla demo-tucanalha, já seria um escândalo o simples fato de ter privatizado três dois mais lucrativos aeroportos do Brasil (Guarulhos, Viracopos e Brasília, leiloados essa semana). Porém, o escândalo maior fica por conta do que virá a seguir: antes mesmo dos leilões, o banco estatal BNDES já anunciara que pretende usar dinheiro público para bancar até 80% dos investimentos a serem realizados nesses aeroportos... Fica então a pergunta no ar: se privatizaram por causa da dita "ineficiência" do Estado, se privatizaram porque "não tem dinheiro", então como se explica que esse mesmo Estado "incapaz" e "sem dinheiro" tenha que bancar quase na totalidade os novos donos dos aeroportos, com empréstimos a juros de mãe pra filho? E como explicar que o comprador do principal desses aeroportos (Guarulhos) seja na maior parte formado por fundos de pensão controlados por gente do governo?

A retórica neoliberal continua hoje tão vazia quanto nos anos 90, com os fatos mostrando que a privatização só se justifica para aumentar os ganhos pessoais dos grandes capitalistas e de seus amigos políticos. Mas se a farsa é a mesma, o que dirá de seus personagens?

Num momento em que os petistas encomendam um livro pra falar da privataria do PSDB nos tempos de FHC, nada mais pertinente observar que, bravatas de lado, o jogo virou. Mudam as cores da privataria. Sai o verde-amarelo tucanalha, entra o cada vez mais desbotado vermelho do PT.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Cadê os direitos humanos?

Pra essa grande mídia que tanto se preocupa com blogueiros "dissidentes" em Cuba (que por sinal, a julgar por suas infindáveis entrevistas à imprensa estrangeira, parecem ser os "dissidentes" mais livres do mundo); pra essa mídia que tanto se atenta a massacres de "opositores pacíficos" na Síria (de novo, a exemplo da Líbia, a "oposição pacífica" mais bem armada do mundo), dessa mídia tão vigilante no cumprimento dos "direitos humanos" nos países inimigos do "ocidente" (ou melhor dizer, do grande centro capitalista internacional), soa estranho não se ver quase nada sobre as violações dos direitos humanos aqui mesmo no Brasil.

Fingem hipocritamente que direito à moradia não é direito humano. Por obra do governo fascista de Geraldo Alckmin (PSDB), quase 9000 pessoas são expulsas à força de suas casas na comunidade do Pinheirinho em São José dos Campos (SP), para a seguir verem suas casas serem demolidas junto com seus móveis, pertences e recordações, tudo junto transformado em escombros apenas para agradar a um banqueiro corrupto que roubou aquelas terras do Estado através de grilagem, e na imprensa só se fala brevemente e depois deixa-se o assunto morrer. Moradores sem-teto continuam sendo expulsos à força pela polícia de prédios desocupados que poderiam muito bem servir-lhes de moradia, mas por obra da "justiça" capitalista, servem tão-somente à ganância da especulação imobiliária.
Acaso o direito à greve não é um direito humano? Onde estão os direitos humanos dos PMs grevistas da Bahia, que por quererem simplesmente um aumento salarial real (acima da inflação) sofrem das mais diversas ameaças, têm seus líderes expulsos da corporação, presos por "formação de quadrilha", etc? Claro, à mídia só interessa mostrar os excessos cometidos por uma minoria desses grevistas, o aumento da insegurança pública, os prejuízos do comércio (!!), etc. Falar dos motivos que empurraram os PMs baianos na direção de tão duro confronto, imagina, isso não faz parte da função da imprensa livre! E os bombeiros do Rio, presos às centenas pelo governo do Estado apenas por exercer o direito humano à greve? 

Ah, se isso tudo se passasse no Irã, na Venezuela ou em outro país do "eixo do mal"... 

Há nove dias que o jornalista Pedro Rios se mantêm em greve de fome em frente à sede da Globo no RJ, sendo inclusive constantemente hostilizado pela polícia em solidariedade à comunidade do Pinheirinho e em protesto contra a cobertura tendenciosa da imprensa no caso. Alguma letra sequer foi divulgada na imprensa sobre essa greve de fome de um verdadeiro dissidente do regime brasileiro? Pros capitalistas, "greve de fome" de "dissidente" só há quando um bandido comum, preso por agredir a esposa, morre na prisão. Mas claro, somente se isso ocorrer nalgum país "inimigo jurado" dos capitalistas e de sua mídia chapa branca...

Acreditam em coincidências?

Primeiro vem a Gobo com a sua série de reportagens no Jornal Nacional falando sobre a "realidade cubana", pouco antes da visita de Dilma a Cuba e na mesma época em que surge a história da tal "pobre dissidente" que queria vir pro Brasil pra assistir um documentário anti-Cuba, a ser lançado na mesma cidade onde, este ano, realiza-se o Encontro Nacional de Solidariedade a Cuba (Salvador). Então Dilma vai embora de Cuba, é negado o visto à "pobre dissidente" mais milionária do mundo (vide os "prêmios" em dinheiro dados a dita cuja pelas organizações de fachada do Império estadunidense) e eis que, antes do assunto morrer de vez na boca do povo, o "Jornal da Band" decide lançar em horário nobre outra série de reportagens sobre a "realidade" cubana que, em outro sublime exemplo do que a burguesia entende por mídia "livre e imparcial", promete nas suas próprias palavras falar da "repressão ao povo cubano"... De novo a grande mídia privada, como amante do "plurarlismo democrático" que é, se fechará no monolitismo midiático de só mostrar "um lado" da história, a dos "dissidentes" mais livres do mundo (porque "dissidentes" de uma "ditadura" que nunca lhes prendeu, nunca lhes fez sequer um arranhão). De novo, sobre o que o governo e o povo cubanos têm a dizer em sua defesa, silêncio. 

Toda essa onda de ataques coordenados vêm pipocando na mídia precisamente na mesma época em que se completam 50 anos do infame bloqueio econômico do Império contra Cuba. Alguém aqui acredita em coincidências?

Globo, Bandeirantes, Estadão, Folha, Veja, O Globo e outros jornalões sempre tão empenhados em "denunciar" a "realidade cubana" são empresas privadas. Cuba é o único país do hemisfério ocidental que aboliu a grande empresa privada. São capitalistas falando sobre o país que aboliu a classe capitalista! Coindidência a "imparcialidade"? Ou estariam eles tentando justificar o grande aniversariante do momento, o bloqueio contra Cuba, odioso crime de guerra condenado pela convenção de Genebra? E porque aqui no Brasil? Talvez porque, eles sabem bem, somos hoje um dos maiores parceiros comerciais de Cuba, que aos poucos vem ajudando a furar o bloqueio, causa principal da dita "miséria" material em que Cuba se encontra, "miséria" essa que é o carro-chefe das campanhas de difamação contra Cuba. Difamar para justificar mais ataques contra Cuba, tentando-se inutilmente destruir seu incômodo exemplo, o exemplo do socialismo e da solidariedade entre os povos, a alternativa à dominação de patrões, capitalistas e banqueiros sobre nós, trabalhadores e pessoas comuns, num mundo onde o capitalismo cada vez mais perde o controle sobre si e afunda em suas próprias crises.

Mas deve ser tudo coincidência, deixe dessa de ficar elaborando teorias da conspiração!

A propósito, alguém aqui acredita em Coelhinho da Páscoa ou Papai Noel?